GERIR O IMPREVISÍVEL

GERIR O IMPREVISÍVEL
em 2020-05-11 Ano: 2020
Crónicas de uma pandemia.png
Autor(es)

Pedro Lavinha

Vogal Conselho Diretivo
INEM – Instituto Nacional de Emergência Médica

O cenário de pandemia que vivemos fez soar alertas em todo o mundo para a necessidade de uma preparação que, globalmente, não tínhamos. Portugal teve, pois, a necessidade de, tal como outros países, enfrentar este cenário.

Tratando-se de uma emergência de saúde pública, resultou numa estratégia ponderada e cientificamente sustentada, possibilitando também, uma oportunidade civilizacional da população portuguesa para se transcender, partilhar, compreender, ajudar e, sobretudo, para se integrar.
Este tempo de turbulência obrigou as organizações a refletir e a aprender sobre estratégias concretas, respondendo ainda a um período de acentuada incerteza.

Para o INEM, o processo foi desafiante na medida em que a intervenção no âmbito pré-hospitalar também teve de ser repensada reactivamente, embora de forma integrada, em todo o território continental. A elaboração e implementação do plano de contingência, assim como a ativação da Sala de Situação Nacional foram importantes medidas de gestão estratégica para a resposta à situação que estava a eclodir.

Deste modo, e em articulação com diversas entidades externas, a informação foi recolhida de forma sistemática e analisada diariamente pela equipa de crise definida, possibilitando pontos de situação de toda a informação relacionada com a COVID-19, bem como a definição de prioridades para os momentos seguintes.

Nessa medida, foi critico garantir a segurança dos nossos profissionais reduzindo as possibilidades de contaminação. Assim, foram adotadas medidas decisivamente eficazes: a criação de equipas dedicadas para o transporte de doentes suspeitos ou com COVID-19; a criação de equipas para colheitas de amostras para a realização de testes; a segregação da operação entre os trabalhadores dos Centros de Atendimento de Doentes Urgentes (CODU) e os dos meios de emergência evitando fluxos de contaminação; a colocação dos trabalhadores em teletrabalho de todas áreas de suporte; o reforço da formação e treino dos profissionais do terreno sobre a utilização dos equipamentos de proteção individual (EPI); reforço das medidas de higienização e limpeza dos edifícios e dos meios de emergência; implementação de linhas de descontaminação de meios de emergência; acompanhamento clínico dos profissionais contaminados, ou que tiveram contacto com pessoas infetadas, através de telefonemas diários, bem como a possibilidade de acompanhamento por parte dos psicólogos do INEM.

Neste contexto, surgiu uma enorme dificuldade nas aquisições. No entanto, o papel da gestão foi um elemento motor nesta área, permitindo manter os níveis de EPI necessários para que os nossos profissionais garantissem, não só a sua segurança, mas a da população no contexto de situações COVID-19 e todas as outras que não eram COVID-19.

Este momento continua a constituir, sem dúvida, uma boa ocasião para “aprender, desaprender e reaprender” (Margarida Bentes, 2008) a mudança adaptativa capaz de ‘eliminar’ os filtros na gestão executiva, impeditivos de uma ação pronta e realista. Uma atitude de gestão autoritária, e silenciosa, é, ela própria, um “vírus” letal para sistemas abertos que são as organizações. Em momentos de crise deve ser adotada a atitude de articulação das estratégias, dos objetivos, das reformas, dos comportamentos, da seriedade e da honestidade, numa lógica de “coerência do conjunto”.

É um dever ético e moral dos gestores em qualquer nível de gestão: institucional, intermédio e operacional.

O isolamento na gestão, com a convicção do saber total e único, sem ouvir os que estão perto e aqueles que estão mais afastados no terreno, é profundamente errado e revela uma enorme ignorância na análise. Estas equipas de trabalho, mais do que nunca, devem saber consolidar-se na unidade e nas suas amplas competências.

Lisboa, 3 de maio de 2020